Nos dias atuais, até mesmo pastores e líderes que possuem pouco ou nenhum conhecimento na área da gestão financeira, reconhecem a sua importância para a saúde organizacional da igreja.

Afinal, a prática ministerial muitas vezes envolve preocupações com questões financeiras e, provavelmente, “no mundo inteiro, [não] haja um empreendimento cristão que não esteja atrasado ou tolhido por falta de fundos”1.

O que poucos sabem é que um dos principais objetivos da gestão financeira na igreja é auxiliar a liderança na construção da reputação organizacional diante de seu público – tanto interno (membros, frequentadores, voluntários e remunerados) quanto externo (visitantes, familiares de membros e a sociedade como um todo).

Para isso, se faz necessária a consciência de que a transparência financeira transcende a questão moral e assume um papel estratégico na gestão da reputação. Uma vez que os escândalos envolvendo a maneira como muitas igrejas e suas respectivas lideranças lidam com os recursos financeiros sob seus cuidados têm levado muitas pessoas a desenvolverem uma compreensão inadequada do cristianismo – principalmente protestante.

O valor da reputação para o crescimento, e até mesmo sobrevivência, de uma instituição já é bem conhecido na gestão empresarial. A diretora executiva do Instituto Marca & Reputação, Cristiane Malfatti, em seu artigo Escala de valores na construção da reputação, acredita que uma organização “é plenamente capaz de superar uma crise financeira ou de imprecisão estratégica, mas com muita dificuldade consegue sobreviver a uma crise moral e de reputação em face do escrutínio público digital, em rede global, que imediatamente se estabelece aos primeiros sinais de desvio”2.

A reputação de uma instituição é edificada a partir de uma constante coerência entre a imagem desejada gerada através de sua comunicação e a percepção do comportamento real pelas pessoas envolvidas. Sendo assim, a reputação de uma organização está diretamente relacionada com a percepção que as pessoas têm acerca da coerência entre discurso e prática.

As Escrituras também nos exortam a buscar essa coerência entre discurso e prática. Em Lucas 6.46, Jesus questiona seus discípulos: “Por que vocês me chamam: ‘Senhor, Senhor’ e não fazem o que eu digo?'”. O que Jesus está denunciando é a incoerência daqueles que em seu discurso reconhecem o seu senhorio, mas na prática, ignoram suas ordenanças.

Diante do papel estratégico que a transparência financeira tem na construção da reputação, nesse artigo, buscarei demonstrar que a reputação negativa gerada pelos escândalos financeiros pode ser evitada se aqueles que se dedicam a importante tarefa de gerenciar os recursos financeiros da igreja considerarem a maneira como o apóstolo Paulo lidou com essa questão em 1 Coríntios 16.1-42 Coríntios 8.16-24.

Transparência financeira demanda planejamento cuidadoso

A primeira lição que aprendemos com o apóstolo Paulo é que para implantar uma gestão financeira transparente, se faz necessária a realização de um planejamento cuidadoso: “Quanto à coleta para o povo de Deus, façam como ordenei às igrejas da Galácia” (1 Coríntios 16.1).

Uma igreja que não planeja o gerenciamento de suas receitas e despesas de forma cuidadosa, sem dúvida, torna a transparência financeira uma prática impossível. Visto que sem planejamento, aumenta-se consideravelmente o risco de que informações não sejam coletadas e documentos necessários para apoiar os relatórios financeiros sejam gerados, registrados e arquivados de forma inadequada.

Quando analisamos a maneira como Paulo lidou com a coleta de ofertas para a igreja de Jerusalém, encontramos dois princípios que devem ser observados em todo planejamento para a realização de uma gestão financeira transparente.

O primeiro princípio para a realização de um bom planejamento é a reflexão com antecedência a respeito de qual trabalho precisa ser feito. Paulo precisou refletir e estabelecer as diretrizes acerca de quais as atividades seriam executadas antes de transmitir suas orientações às igrejas.

No contexto da coleta, Paulo compreendeu que era necessário gerenciar a arrecadação – “cada um de vocês separe uma quantia” (v. 1), eleger os representantes – “entregarei cartas de recomendação aos homens que vocês aprovarem” (v. 3a), enviar as ofertas – “os mandarei para Jerusalém com a oferta de vocês” (v. 3b) e supervisão pessoal – “se me parecer conveniente ir também, eles me acompanharão” (v. 4).

O segundo princípio para a realização de um bom planejamento é o estabelecimento de processos claros e objetivos a respeito de como o trabalho deve ser feito. Mais do que dizer o que precisava ser feito, Paulo também orientou a igreja em Corinto quanto a maneira como deveriam realizar o projeto.

A arrecadação deveria ser coletada no primeiro dia de cada semana, de acordo com a renda de cada um, evitando que Paulo tivesse que fazer coletas quando chegasse. Além disso, as igrejas teriam a oportunidade de escolher os representantes e a esses Paulo entregaria cartas de recomendação. Repare que, sem planejamento, essas providências não poderiam ser tomadas antes que ele chegasse.

Da mesma forma, a igreja precisa planejar seus processos administrativos com antecedência para que se tenha todos os recursos necessários disponíveis para a prática de uma gestão financeira transparente.

Transparência financeira demanda métodos adequados

A segunda lição que aprendemos com o apóstolo Paulo é que para implantar uma gestão financeira transparente, se faz necessária a utilização de métodos adequados: “queremos evitar que alguém nos critique quanto ao nosso modo de administrar essa generosa oferta, pois estamos tendo o cuidado de fazer o que é correto, não apenas aos olhos do Senhor, mas também aos olhos dos homens” (2 Coríntios 8.20-21).

As duas expressões – “modo de administrar” e “fazer o que é correto” – apontam para a maneira correta de se manusear o dinheiro confiado à igreja. Ou seja, Paulo estava preocupado em utilizar uma metodologia adequada com o propósito de evitar que alguém os criticassem. Em outras palavras, não basta ter boas intenções, é preciso ter bons métodos para transmitir credibilidade e honestidade.

Jack A. Henry, em seu livro Basic Accounting for Churches, afirma que alguns pastores tentam justificar sua maneira desorganizada e inadequada de lidar com o dinheiro confiado à igreja dizendo que mesmo que as pessoas não compreendam, Deus conhece o seu coração. Contudo, de acordo com autor, Deus nos diz que não basta ser honesto apenas aos seus olhos, antes é preciso ser honesto aos olhos de todas as pessoas quando lidamos com os seus recursos financeiros3.

As pessoas gostam de saber que suas contribuições estão sendo registradas adequadamente e utilizadas de acordo com os propósitos desejados. Quase nada pode minar mais a missão da igreja e seus programas do que dúvidas sobre a credibilidade da gestão financeira.

A liderança deve ser sensível a essa questão, se dedicando a compreender os princípios financeiros e contábeis que envolvem uma boa gestão financeira e reconhecer quando sua igreja está com problemas, fazer mudanças e, se necessário, buscar a ajuda de especialistas.

Quando a maneira como a igreja utiliza o dinheiro gera desconfiança nas pessoas com as quais se relaciona, a generosidade encorajada pelas Escrituras pode ser comprometida.  Júlio Andrade Ferreira não duvida que “maus administradores matem a graça da liberalidade em muitos corações, [por isso] o primeiro cuidado é o da administração [visto que] a boa despesa estimula a receita”4.

Se você não sabe como gerenciar as finanças de sua igreja através de uma metodologia que possibilite a prestação de contas e, consequentemente, uma transparência financeira saudável, a leitura do meu e-book gratuito Gestão Financeira para Igrejas pode te ajudar.

Transparência financeira demanda responsabilidades compartilhadas

A terceira lição que aprendemos com o apóstolo Paulo é que para implantar uma gestão financeira transparente, se faz necessário que as responsabilidades no controle das contribuições sejam compartilhadas, envolvendo mais do que uma pessoa.

G. R. Beasley-Murray comenta que “se Paulo tivesse levado sozinho as ofertas das igrejas gentílicas, interrogações poderiam ser levantadas, tanto em Jerusalém como entre as próprias igrejas gentílicas, quanto à possibilidade de Paulo ter retido parte do dinheiro”5. Talvez essas suspeitas estavam baseadas em fatos que já haviam acontecido anteriormente em Roma.

Flávio Josefo conta a história de um importante romano convertido ao judaísmo, chamado Fulvia, que fora induzido a enviar objetos de valor ao templo de Jerusalém por um judeu palestino e seus três parceiros que afirmavam instruir as pessoas na lei de Moisés. Uma vez em sua posse, tais objetos foram vendidos e o dinheiro desviado de sua finalidade original. Essa atitude provocou um escândalo tão grande que o imperador Tibério ordenou que todos os judeus fossem banidos de Roma6.

Prevenindo-se de tal suspeita, Paulo não assumiu a responsabilidade de levar as contribuições a Jerusalém sozinho, mas nomeou Tito juntamente com outros dois irmãos que haviam sido escolhidos como “representantes das igrejas e uma honra para Cristo” (2 Coríntios 8.23) para acompanhá-lo nesse projeto.

Seu propósito com essa atitude era garantir a integridade do projeto evitando qualquer contato direto com as ofertas coletadas, bem como fornecendo testemunhas independentes escolhidas e aprovadas pelas igrejas7.

Assim como Paulo, os pastores e líderes precisam trabalhar para assegurar a transparência financeira através de pessoas cuja reputação é reconhecida por toda a igreja. E para isso, a contagem das ofertas devem receber uma atenção especial. John Stott alerta que “é bom que as igrejas sejam abertamente cuidadosas quanto ao número de pessoas presentes no momento que as ofertas são contadas e forneçam aos membros da igreja relatórios regulares das finanças”8.

Conclusão

A transparência financeira, portanto, exerce um papel estratégico na gestão da reputação da igreja. Assim sendo, deve-se entender que esta não se constitui uma opção para a gestão financeira da igreja, mas sim um dever da liderança e um direito dos contribuintes.

Por isso, a liderança deve trabalhar para implantar uma gestão financeira transparente através de um planejamento cuidadoso, adotando métodos adequados e compartilhando as responsabilidades com pessoas de confiança da igreja.

Agindo dessa maneira, a igreja evitará a reputação negativa advinda de escândalos financeiros e as pessoas envolvidas com as atividades gerenciais estarão protegidas contra qualquer suspeita moral. Podendo, como Paulo, declarar: “não damos motivo de escândalo a ninguém, em circunstância alguma, para que o nosso ministério não caia em descrédito” (2 Coríntios 6.3).

Notas

1. STOTT, John. A igreja autêntica. Viçosa: Editora Ultimato; São Paulo: ABU Editora, 2013. p. 109.

2. MALFATTI, Cristiane. Escala de valores na construção da reputação: diante da crise atual de propósitos e valores, com dramática falta de confiança e credibilidade, o binômio competência e solidez financeira já não garantem prosperidade e perenidade. Disponível em: <http://www.meioemensagem.com.br/home/opiniao/2016/06/01/escala-de-valores-na-construcao-da-reputacao.html/>. Acesso em: 10 fev. 2017.

3. Cf. HENRY, Jack A. Basic accounting for churches: a turnkey manual. Nashville: Broadman & Holman Publishers, 1994. p. 5.

4. FERREIRA, Júlio Andrade. A graça da liberalidade: o dízimo cristão. Campinas: Luz para o Caminho, 1985. p. 50.

5. BEASLEY-MURRAY, G. R. 2 Coríntios. In: ALLEN, Clifton J (ed.). Comentário bíblico Broadman: Novo Testamento. 2. ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1985. v. 11. p. 80.

6. Cf. TALBERT, Charles H. Money management in early mediterranean christianity: 2 Corinthians 8-9. Review and Expositor, n. 86. 1989. p. 365.

7. Cf. HARRIS, Murray J. The second epistle of the Corinthians: a commentary on the greek text. Grand Rapids: Eerdmans, 2005. p. 596.

8. STOTT, A igreja autêntica, p. 118.

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